Fotografia: David Santos, Nuno Augusto
Textos: Vanessa Sousa
Tradução : Adam Prus
Editora Flying Book House, 2016
Receita para fazer o azul
Se quiseres fazer azul,
pega num pedaço de céu e mete-o numa panela grande,
que possas levar ao lume do horizonte;
depois mexe o azul com um resto de vermelho da madrugada,
até que ele se desfaça;
despeja tudo num bacio bem limpo,
para que nada reste das impurezas da tarde.
Por fim, peneira um resto de ouro da areia do meio-dia,
até que a cor pegue ao fundo de metal.
Se quiseres, para que as cores se não desprendam com o tempo,
deita no líquido um caroço de pêssego queimado.
Vê-lo-ás desfazer-se, sem deixar sinais de que alguma vez ali o puseste;
e nem o negro da cinza deixará um resto de ocre na superfície dourada.
Podes, então, levantar a cor até à altura dos olhos,
e compará-la com o azul autêntico.
Ambas as cores te parecerão semelhantes,
sem que possas distinguir entre uma e outra.
Assim o fiz – eu, Abraão ben Judá Ibn Haim, iluminador de Loulé – e deixei a receita a quem quiser
algum dia, imitar o céu.
Nuno Júdice